Vulnerabilidade é incerteza, são risco e exposição
emocional. Acordar todos os dias e amar alguém que pode ou não retribuir, e
cuja segurança não podemos garantir, que pode ou não estar em nossas vidas um
dia e partir sem aviso no outro, pode ou não ser fiel até a morte ou nos trair
no dia seguinte isso é vulnerabilidade. O amor é incerto e nos oferece risco incrível.
Nos deixa expostos. É sem duvida alguma é assustador e sem duvida nós podemos
sair muito magoados. Mas como imaginar a nossa vida sem amar e sem sermos
amados?
Viver com uma doença que nata 90% de quem a contrai
por anos a fio, sem saber o que será o seu amanhã é desconcertante e te expõe a
um tipo de emoção que machuca tão profundamente que você acaba por aprender a
conviver com a vulnerabilidade.
A dor de não saber se seus planos para o mês
seguinte serão realizados, a dor de não saber se seus sonhos serão
concretizados, é intensa. Não que algum ser humano ou qualquer outro ser
vivente tenha uma garantia maior do que a sua, apenas no caso de um câncer a
sua certeza não deixa nenhuma sombra de duvidas de que você caminha na via rápida
do fim. Por isso fica tão dificil fazer planos para alguém que está lutando com
um câncer.
Exibir nossa arte, nossos textos, nossas fotos e
nossas ideias ao mundo, sem nenhuma garantia de aceitação ou apreciação, também
significa nos colocar numa posição vulnerável. Quando nos entregamos aos
momentos felizes de nossa vida, mesmo sabendo que eles são passageiros e que o
mundo nos diz para não sermos felizes demais para não atrair a desgraça – essa é uma forma intensa de vulnerabilidade.
Sem duvida alguma vamos em qualquer um desses
quadros acima vamos começar a enxergar os sentimentos como fraqueza. Com exceção
da raiva ( que é uma emoção secundária, que serve apenas como uma máscara
socialmente aceitável para muitas das nossas emoções secretas bem mais difíceis
que experimentamos), estamos perdendo a tolerância em relação aos nossos
sentimentos e, em consequência disso
perdemos toda a nossa vulnerabilidade.
Se quisermos recuperar a parte essencial de nossas
emoções e sentimentos, vamos ter que assumir a nossa vulnerabilidade e acolher
nossas emoções que resultam disso tudo.
Para mim é um aprendizado novo devo confessar, só
comecei a pensar seriamente em me expor e deixar me ver depois do diagnostico
de câncer, antes nunca em hipótese alguma isso passou pela minha cabeça. Nesses
quatro anos aprendi que a melhor maneira de começar a lidar com minha
vulnerabilidade é definindo e reconhecendo o que é vulnerabilidade.
Então vou deixar aqui com você uma pequena lista do
que é vulnerabilidade para mim:
Vulnerabilidade é expressar uma opinião impopular./
é me defender e me impor/ é pedir ajuda/ é dizer “não” / é lidar com meu câncer
sem me tornar vitima dele/ é tomar iniciativas/ é telefonar para alguém que
perdeu um ente querido/ é voltar a viver depois de sair de um relacionamento
violento/ é dizer “eu te amo” sem saber se será retribuída/ é mostrar o que
escrevo/ é fazer planos mesmo sabendo que eles poderão não se realizar/ é
tentar uma coisa nova/ é esperar um resultado de biopsia/ é admitir que sinto
medo do me espera na hora da morte/ é demitir um funcionário, mesmo que seja a
faxineira que não faz o serviço como você deseja/ é apresentar meu livro ao
mundo e não ter retorno/ me impor para defender meus amigos quando ouço
criticas a respeito deles/ é ser responsável/ é pedir perdão/ é ter fé/ é ter
coragem de pedir ao meu oncologista que quando chegar minha hora quero ser
sedada, não quero sofrer além da conta.
Por toda a minha vida a perda do meu filho, e o meu
diagnostico de câncer um após, tudo isso soava para mim como fraqueza. Eu acreditava
que me colocar ao lado de alguém que estava atravessando uma grande dificuldade
era fraqueza. Que assumir a minha responsabilidade era coisa que só gente fraca
faria. Hoje tenho uma visão completamente diferente do assunto.
NÃO. Ser vulnerável para mim hoje não é fraqueza ao
contrario é ser verdadeira e é sinal de uma imensa coragem. Verdade é coragem
nem sempre são confortáveis devo admitir, mas nunca são fraqueza.
Se quando estamos vulneráveis estamos totalmente
expostos, sentimos que entramos em uma câmara de tortura (é essa a sensação que
a incerteza) nos dá assumimos um enorme risco emocional. Mas isso não é
fraqueza.
Tirar nossa máscara e ficarmos esperando que nosso verdadeiro
eu não seja tão decepcionante não é fraqueza, é o encontro da coragem com o
medo.
Porque sempre que nos encontramos vivendo no meio
da corda bamba, é uma sensação assustadora, mas muitas vezes a vida nos impõe vivermos
ai por um bom tempo, eu estou vivendo exatamente ai desde que o Vinicius morreu
a cinco anos e estou aprendendo.
Tem sido muito mais comum do que eu imaginava que
seria ter minhas suadas e meu coração disparando a cada nova noticia
decepcionante sobre a evolução do câncer, mas tenho conseguido me manter
digamos dignamente em uma posição de equilibrista da corda bamba. Tenho medo,
as vezes fico aterrorizada e em outras empolgada e esperançosa mas mesmo com
todos esses sentimentos tão contraditórios tenho conseguido.
Dei a muito tempo o primeiro passo no que mais
temia que foi quando me sai de um casamento violento. Me sinto sim desconfortável
e assustada, mas também me sinto humana e viva. As vezes penso que tenho um tijolo em
minha garganta e um nó em meu peito.
Mas tenho sobrevivido acima da media não tenho
nenhuma duvida sobre isso.
No meu caso por eu nunca ter trabalhado de carteira
assinada, meus rendimentos caíram quase a zero, são apenas um salário mínimo do
INSS, muitas vezes ainda tenho que engolir o orgulho e pegar no telefone e
fazer o que ainda acho mais difícil de fazer que é pedir dinheiro para que
possa cumprir as minhas necessidades básicas, ou mesmo algum exame ou medicamento
mais car. Mas mesmo assim não tenho perdido o controle é infinitamente aterrorizante
e doloroso mas é necessário.
Tenho colocado tudo na conta do aprendizado. Vou
sair desse mundo uma pessoa muito mis sabia do que entrei nele a mais de
cinquenta anos.
Seu comentário é importante para meu trabalho,
deixe-o aqui.
Muito obrigado!
Fátima Jacinto
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